terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Ninguém



Quando eu era mais nova, sempre prezei pela presença e carinho de amigos e pessoas que gostava. Já me permiti tomar muito na cara e me prejudicar por receio de dizer não e acabar conseguindo a inimizade, ódio ou raiva de alguém.

Sempre pergunto, às vezes aleatoriamente para os que eu considero, quais são os meus defeitos, se faço algo que incomodo, que ofendo. Às vezes a gente faz coisas que não são legais, mas não percebe. E amigo não é só aquele que senta na mesa pra tomar cerveja com você, mas que também te pega pelo braço e fala na sua cara, por sms ou messenger se você fez algo que não pegou bem, que foi idiota e que você está fazendo há um tempo mas até então ninguém tinha parado pra te avisar.

Algumas das minhas amizades são de longa data. Pessoas que já briguei de ficar sem nos falarmos por longas semanas e meses, mas depois eu cedia ou ia atrás. Porque é aquilo ali, né? Não adianta ver seu amigo ser um imbecil ou fazer merda e virar a cara pra ele, de graça, sem informá-lo do que ele fez. Isso não é justo.

Acho que isso torna a gente vulnerável de tal forma, como se abríssemos nosso peito e ele fosse um portal espelhado igual aos dos filmes e jogos de videogame que a gente vê por aí. Falar sobre o que pode de derrubar, sabe?

Tinha um emocional um tanto fraco também. Não no sentido de não sentir, mas por sentir demais. Nunca consegui de fato me envolver casualmente com uma pessoa, sem acabar me imaginando fazendo ela sorrir num piquenique no parque, assistindo o filme favorito dela, sendo a pessoa que a incentivou a correr atrás dos sonhos dela ou fazendo um cafuné até ela dormir.

Nas amizades era a mesma coisa, tirando o cafuné ou o envolvimento sexual, mas queria ver meus amigos voarem como balões e eu ser a pessoa que fica no chão segurando as cordinhas para que não escapassem, olhando-os voar e sorrindo. Sempre foi muito gratificante pra mim ver meus amigos felizes e alcançando seus objetivos. Estando eu na merda, era ainda melhor, pois tinha um motivo para me sentir contente.

Mas com exceção de um, as pessoas que já passaram ou ainda estão na minha vida, de uma forma ou de outra já acabaram falando ou tendo atitudes que me impactaram de forma negativa, que ficaram na minha cabeça, que me afastaram.

Eu tenho muitos defeitos, muitas inseguranças, muitos complexos. Nunca me senti ou me achei melhor do que absolutamente ninguém. Trabalho todos os dias o hábito de julgar situações ou pessoas, ainda que seja somente por pensamento. Já que isso se torna algo inconsciente seu, de tanto que você é instruída a fazer desde que se entende por gente.

Eu estou aqui com 24 anos. Quando falo que estou ficando velha, não falo no sentido de sabedoria, me sentindo um Gandalf. É que antigamente, antes da terceira idade se tornar mais ativa do que a primeira e segunda idade, nós chamávamos de velho pessoas com pouca disposição.

Hoje em dia, pessoas pelas quais já fui apaixonada, amei e me destrocei por elas me fizeram aprender muito sobre amor e relacionamento mesmo sem nunca ter tido um. Pessoas com as quais já até fui invasiva de tão desesperador que era a vontade de ver a pessoa e eu acabei tomando atitudes deselegantes em relação a insistência, que ainda tem amizade comigo mas que hoje se tornou algo tão insignificante, que até chateia a gente, pelo tanto que ela já significou.

Estar se sentindo velha e cansada, embora fale muito, não é algo de que me orgulho. Não tenho disposição de investir em amizades novas. Pessoas que a gente acompanha por redes sociais e morre de vontade de ter por perto pra sentar na calçada, bater um papo e tomar uma cerveja gelada no copo americano. De conquistar a confiança e se tornar o refúgio dela. Pra mim, fazer amizade só pra role eu nem faço. Pra ser meu amigo, tem que me envolver nas furadas, dividir os problemas comigo, chorar no meu colo e eu ser a primeira a saber se você passou na faculdade dos seus sonhos ou conseguiu vaga na empresa que mais almejou trabalhar a vida toda.

Vida amorosa é algo em que eu nunca apostei. A gente sonha porque é como se fosse em Westworld, como se você tivesse sido criada pra sentir e pensar naquilo em consequência de algo que fosse programado pra te fazer sentir e pensar naquilo. Já me apaixonei bastante, já amei de me dilacerar. O problema é que eu nunca falo do meu amor, eu sinto bastante e tento demonstrar como sei fazer, ou como acho que sei. Mas nunca aconteceu como nesses filmes, sabe? Da gente sentir algo por alguém sem ela saber, mas ela também sentir pela gente. Geralmente, o que eu sentia de amor ou carinho, a pessoa sentia de repulsa. E no final a gente acaba fazendo isso com quem gostava da gente também, às vezes sem até perceber.

Hoje, ter dinheiro é raro então eu dificilmente troco aquela oportunidade de economizar por uma noite com amigos em bar ou balada. Prefiro pegar um cinema sozinha nos dias mais baratos, comprar um livro ou pedir alguma comida que esteja com vontade, mas sair com galera não.

No final das contas o problema não era a garota que eu chamava de amiga e que debochou de mim por anos fazendo eu me sentir um lixo. Não era dos caras que me apaixonei e que saíam comigo como se estivesse tudo bem e dias depois apareciam com relacionamento novo ou reatado com ex, ou que simplesmente não gostavam de mim como gostava deles. Não é dos amigos que muitas vezes não fazem o mínimo de esforço pra pensar antes de dizer uma palavra que possa te ofender ou passar uma impressão muito ruim sobre o caráter deles. O problema sempre foi meu, que vi problema demais em tudo. Que fico analisando demais, como se porquê um disse que é legal ser assim, eu tenha que ser o tempo todo com todo mundo. E não é só olhar o rabo dos outros não. É olhar tanto pro meu, que não me sinto uma companhia legal ou saudável pra ninguém. Não ser receber elogio sem ser deselegante, porquê não sei o que responder, se só um obrigada já serve. Eu desconfio mais de quando as pessoas demonstram coisas boas pra mim ou por mim do que coisas ruins. Eu não sei distinguir deboche ou tiração de sarro de uma demonstração sincera de um sentimento bom. Eu aceito que sejam babacas comigo porque além de ser o que eu acho que mereço, é quando eu sei que é sincero. Ninguém te trata mal por impulso, pra fazer uma média, por interesse, desespero ou pra esconder alguma coisa. Sempre um mal tratamento vai ser sincero, vai ser de dentro. O bom eu nunca sei.

Nessa loucura, eu escolhi ficar sozinha. Um pouco cansada emocionalmente ou psicologicamente. Cansada de achar que eu tenho que opinar em tudo que é assunto que surge, eu não tenho. De achar que eu tenho sempre que passar boa impressão, eu não tenho. Eu sou um ser humano, vou ter dias péssimos, a maioria deles na verdade. Mesmo tendo dias ruins, nunca desconto meus problemas em ninguém, o mau humor de ter acabado de acordar, de sentir forme, de ter me permitido ser aborrecida pelas atitudes de outras pessoas. Eu sempre aviso e peço pra ignorarem minha existência, se possível. De achar que todo mundo tem que ser desconstruído, sem preconceitos, inteligentes e bem instruídos socialmente. Cada um teve sua criação, seu caminho traçado até se tornar alguém que pudesse controlar os próprios passos. E tem gente aí até hoje que é marionete das pessoas, dos amigos e família, principalmente no que se trata de opiniões.

Mas aí o tempo vai passando e meu interesse por panelas antiaderentes vai aumentando e pela companhia das pessoas diminuindo. Cada vez mais dou valor a deitada que meu cachorro da na minha perna pedindo carinho, os torrents legendados, numa carteira assinada, no sossego e no silêncio.

Como vou conviver com pessoas se eu não sei conviver comigo? De que adianta tentar se fazer de compreensível com meus amigos, de querer ficar por perto se não vou conseguir ser capaz de não detestá-los ou desprezá-los amanhã? Não sou capaz de entender nem o meu desinteresse, imagina as pessoas que já considerei como amigos e até mesmo os amores? Eles são seres humanos normais como todo mundo, como eu, inclusive. Por quê sinto tanta raiva, tanto asco e preguiça deles? Ah, é verdade... porque sinto de mim também.

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